16 junho 2010

Uma história, dois destinos...


A British Petroleum é responsável pelo maior derrame de petróleo da História nas costas americanas. Assim, o presidente Obama fez uns telefonemas e já teve ocasião de dizer ao presidente da companhia que vai ter de criar um fundo de 20 mil milhões para cobrir prejuízos e vai ter de pagar até ao último dólar aquilo que se está a passar nos Estados Unidos, o que poderá conduzir a empresa britânica ao colapso financeiro.

Aprecio o rigor e a frontalidade com que os americanos exigem compensações quando são prejudicados.

É pena que esse mesmo rigor não seja aplicado no caso da Union Carbide que em 1984 foi responsável por uma fuga de gases tóxicos que provocou dez mil mortos imediatos e mais quinze mil ao longo de 20 anos em Bhopal na Índia. Esta tragédia foi resolvida com 470 milhões de dólares pagos às autoridades indianas ('tá-se mesmo a ver, não é ?...) Aliás, nunca a empresa se sentou no bancos dos réus na Índia, com as autoridades a deixarem protelar os assuntos para além do que é admissível. Para cúmulo do ridículo, foram recentemente condenados oito funcionários indianos por negligência mais de 25 anos após os acontecimentos.
Por isso a BP arrisca-se (e bem...) a falir porque foi negligente e está a prejudicar americanos e a Union Carbide está de boa saúde porque, obviamente, 25.000 indianos mortos não valem uma multinacional americana...
PS - Se fosse no século XIX, os indianos ainda tinham de indemnizar os americanos pela fuga de gaz e consequentes perdas associadas...

11 junho 2010

O senhor doutor está sem criada há uma porrada de tempo...

Vem hoje no “Sol” um longo artigo de José António Saraiva que desenvolve uma pitoresca tese socio-económica : num país em que não se consegue contratar uma “empregada doméstica interna”, as políticas de apoio social devem ser “repensadas”pois provavelmente os subsídios estarão a fomentar a “preguiça”.

Não posso deixar de classificar esta teoria macro-económica como socialmente asquerosa pelas razões que passo a enunciar :

1 – As criadas (é assim que se diz na minha terra, senhor doutor...) trabalham 16 horas por dia durante 6 dias por semana e recebem (quando recebem...) 400 euros no fim do mês, o que dá uma média horária de 96 cêntimos de retribuição.

2 – As criadas dormem geralmente em quartos interiores exíguos e sem janela e devem ser obedientes e atentas aos desejos dos seus amos – o senhor doutor, a esposa do senhor doutor e os filhos do senhor doutor que, no melhor dos casos, as tratam por tu e, no pior, as desrespeitam numa base regular.

3 – As criadas são, assim, uma “profissão” que tende a não ter um grande número de candidatas no Portugal do século XXI por o seu exercício se assemelhar bastante ao da escravatura doméstica, dependendo da bondade dos seus amos o grau da sua infelicidade pessoal.

Assim, aos senhores doutores que se queixam amargamente por não conseguirem contratar uma Maria corada que lhes limpe a casa, cozinhe as refeições, passe a roupa a ferro e leve os meninos ao colégio, eu recomendaria que comecem por dobrar as suas próprias meias porque a vida está mesmo pela hora da morte e, de facto, ainda não atingimos o grau de pobreza miserável generalizada dos anos 40 que garantia o fornecimento de carradas de "empregadas domésticas internas"...

PS - Este "problema" de escassez de criadas já é antigo. Tanto que é conhecida a história do banqueiro que as ia buscar aos pares às Filipinas nos anos 80 e lhes pagava um magro salário que era "guardado" pela esposa num acesso de caridade cristã, não fossem as raparigas gastá-lo mal gasto em iniquidades...